Teste Cego de Amplificadores

(Por Marcelo Yared)

Pessoal,

Este pequeno texto explica um teste de audição que propus aos amigos da lista Somtrês, bem como seus resultados. O teste  surgiu no contexto de uma discussão sobre se amplificadores para uso em PA seriam adequados para utilização residencial.

Em tese, amplificadores para “public address” são produzidos tendo em vista a maior eficiência possível, mas, é certo, são utilizadas as mesmas técnicas de projeto dos demais amplificadores, seja de qual classe forem. Então, surgiu a questão: seria possível distinguir-se qualidade sonora entre amplificadores para uso residencial e para PA?

E, subsidiariamente, dado que desde a década de setenta amplificadores (razoavelmente) bem projetados apresentam características objetivas muito boas, seria possível perceber diferenças significativas entre eles em testes controlados, dos quais não se saiba qual amplificador está se ouvindo? Nossos ouvidos seriam a ferramenta mais adequada para comparações do tipo? Nosso cérebro pode nos enganar sob certas condições?

De fato, muita pesquisa em psicoacústica foi feita sobre essas questões e hoje sabemos com razoável precisão os limites para os quais amplificadores de áudio e outros equipamentos da cadeia de reprodução sonora são, digamos “transparentes” à nossa capacidade de distinguir ou perceber variações na resposta e outras irregularidades na reprodução. Assim, com o intuito de colaborar com a discussão, montei a seguinte gambiarra, de forma a gerar arquivos de alta definição de músicas selecionadas para testar amplificadores:

1

Em tese, se a geração do sinal e a captura da placa forem de alta fidelidade e se colocarmos diferentes amplificadores sob teste, diferenças de qualidade objetivas (distorção, ruído, zumbido etc) serão percebidas, se significativas. Na entrada coloquei conteúdo musical variado obtido no Tidal (www.tidal.com), reproduzido com qualidade Master ou HiFi, de forma a ter a melhor reprodução possível. Importante lembrar que a gravação no Tidal, até pouco tempo atrás, não era padronizada em amplitude, ou seja, as várias gravações lá disponíveis têm níveis diferentes.

O ADC na verdade é a entrada de linha de minha placa de testes de áudio, a Asus Essence STX II, da qual alterei os operacionais na entrada de forma a obter THD residual menor ainda, apesar da característica original ser muito boa:

2

A placa apresenta excelentes 118dB de relação sinal ruído na entrada e distorção harmônica total em torno de 0,0003%, que abaixei para 0,0001% com mudanças na parte analógica da entrada. Realmente não deve agregar nada audível ao conteúdo musical reproduzido.

A qualidade objetiva da placa foi verificada pela revista Stereophile, com equipamentos de alta precisão:

https://www.stereophile.com/computeraudio/asus_xonar_essence_ststx_soundcards/index.html

Para gerar os arquivos capturados da entrada analógica da placa, utilizei este software:

3

Ele é bastante versátil e permite a gravação com a amostragem e profundidade máximas permitidas pela placa de captura. É barato para registrar e ótimo para testes. Foi ajustado para capturar o sinal sem compressão, em 24 bits e com 48kHz de amostragem.

O ESQUEMA PROPOSTO foi o seguinte, encaminhado por e-mail para a lista:

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Pessoal,

Terminei a gravação dos arquivos de músicas para o nosso teste “quase cego”.

Os arquivos estão disponíveis, compactados, no seguinte link: https://mega.nz/#F!LkBSTQSQ

Os amplificadores utilizados, todos “powers” sem pré-amplificação, foram os seguintes:

  • Polyvox PM5000;
  • Cygnus PA800 (sem nenhuma restauração, original como comprei na década de 80);
  • Power para PA Wattsom DBS360 (original, sem nenhuma restauração);
  • Power classe A que montei recentemente, similar ao que publiquei os resultados recentemente. Do ponto de vista de reprodução objetiva, está no limite do que pode se obter de um amplificador, atualmente.

As músicas que escolhi foram:

  1. You´re the One That I Want – do Álbum Grease;
  2. Rosa de Hiroshima – Ney Matogrosso;
  3. Bad Girls – Donna Summer;
  4. Concerto de Brandeburgo Número 5 – Allegro – Orquestra de Câmara do Sarre;
  5. Feira de Mangaio – Clara Nunes e Sivuca.

Fiz  a gravação neste software: https://www.nch.com.au/soundtap/index.html mantendo o mesmo nível para todas elas e os amplificadores com no máximo 5 volts pico-a-pico na saída, resposta plana e idêntica para todos.

Assim, se o sistema de som que vocês utilizarem não for inferior aos amplificadores utilizados, em tese diferenças de qualidade sonora poderão ser observadas.

Em algumas das gravações eu fiz ajustes depois para a publicação, mas todas foram gravadas em .WAV, sem compressão, em 24bits e 48kHz. Todas estão integrais e com o máximo de fidelidade possível. Essas configurações foram feitas no software da NCH.

Todas as músicas foram gravadas a partir do Tidal, em formato Master ou HiFi, máxima qualidade.

Os resultados das audições devem ser entregues da seguinte forma, na tabela abaixo:

Os amplificadores A, B, C e D devem ter nota de 1 a 4 do ponto de vista de qualidade sonora, relativa entre eles, para cada uma das músicas, que estão numeradas de 1 a 5.

Caso não seja possível distinguir-se qualidade entre amplificadores e/ou músicas, deve-se colocar a mesma nota para ambos(as), de 1 a 5.

4

O campo observações pode ser utilizado para informar alguma percepção relevante sobre as gravações.

Por favor, mandem seus resultados, até sábado que vem (20/04), para o meu e-mail (marceloyared@xxxxxxxxx). Compilarei e no domingo divulgo os resultados e revelo qual amplificador é qual.

Seria interessante não compartilhar ou divulgar na lista ou no ZAP, para não influenciar os demais participantes.

Forte abraço,

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PONTOS DE CONTROLE NAS GRAVAÇÕES

Em relação às gravações, é importante esclarecer que, como em todo os testes do tipo, foram colocados pontos de controle, ora descritos:

– Todas foram feitas com ajuste idêntico de nível na entrada da placa, a partir de um sinal de -23dBFs de 19500Hz. Isso permitiu manter, em tese, o mesmo nível de sinal aplicado para cada amplificador. É um nível propositalmente baixo para evitar-se saturação;

– esse sinal, uma senóide pura, está nos primeiros segundos de uma das gravações (música 1) e permite também verificar a extensão da capacidade auditiva os participantes. Como era de se esperar, nenhum ouvinte apontou sua existência. Ouvir até próximo de 20kHz é incomum, sendo o mais provável que crianças e adultos muito jovens consigam ouvir até esse limite;

– para avaliar o efeito (relativamente comum) de expectativa subjetiva (‘bias”), uma das gravações, a de número 5, foi efetuada diretamente do Tidal na entrada da placa Asus Essence, não passando por nenhum amplificador. Em tese, não deveria haver percepção de diferença entre nenhuma das 4 gravações dela. Ela foi o nosso “placebo” do teste;

– em uma das músicas houve a inversão proposital de canais, para um amplificador, bem como foi escolhida uma música para que essa inversão ficasse aparente, para verificar se os ouvintes percebem a situação no espaço da gravação ou teriam problemas com a imagem estereofônica de seus “setups”.

 

RESULTADOS TABELADOS

Ouvinte I

ouv1

Observações:

– AMPLIFICADOR B: mais detalhista que os outros;

– AMPLIFICADOR D: derrapou um pouco em médios intensos.

Ouvinte II

ouv2

Observações:

– Algo que notei nas músicas 1 e 3 a dinâmica extremamente achatada, comprimida;

– Os amplificadores A e B me pareceram melhores na maioria das vezes principalmente em graves e agudos, chegando a ter uma semelhança incrível em vários momentos das reproduções;

– Onde dei notas menores que 3 senti fadiga auditiva na reprodução (interessante que ouvi mais de uma vez, com falantes diferentes, mas mesmo resultado);

– O brilho das reproduções notei muito mais em A e B do que em C e D.

Ouvinte III

ouv3

Observações:

– Estou dando 5 como nota máxima, baseado na qualidade desses arquivos, ou seja, a escala vai de 1 até 5 nesse universo, porém acredito que é possível ter uma qualidade superior à esses arquivos;

– Eu notei que todos ficaram levemente velados, porém todos no mesmo nível. No mesmo pendrive eu coloquei alguns FLAC (48KHz e 96KHz) e claramente soaram melhor. Talvez tenha sido a forma como foram gravados, acredito eu. No geral, tive que ouvir várias vezes para poder notar diferenças, e, honestamente, as diferenças são tão sutis que até mesmo os 4 que dei abaixo são questionáveis.

Ouvinte IV

ouv4

Ouvinte V

ouv5

Observações:

– Achei as gravações com pouco volume;

– AMPLIFICADOR A: Em geral mais suave o som com menos médios e mais agudos e graves que os demais;

– AMPLIFICADOR B: semelhante aos AMPLIFICADORES C e D os médios aparecem um pouco mais observando que em cada gravação algum instrumento em particular se destaca;

Ouvinte VI

ouv6

Observações:

– Confesso que foi difícil escolher a nota para cada amplificador/música, pois as diferenças são bem sutis, e foram dadas com base no subjetivo.

Ouvinte VII

ouv7

Observações:

  • AMPLIFICADOR A: me pareceu ter o som mais encorpado nos graves que B e C, mas parecido com D;
  • AMPLIFICADOR B: teve reprodução mais plana que os outros com leve reforço de agudos;
  • AMPLIFICADOR C: teve reprodução com leve reforço de agudos;
  • AMPLIFICADOR D: teve reprodução com leve reforço de graves e aparentemente mais distorção que os outros.

 IDENTIFICAÇÃO DOS AMPLIFICADORES

  • Amplificador A: Classe A moderno de 25 watts por canal;
  • Amplificador B: Cygnus PA800;
  • Amplificador C: Wattsom DBS360;
  • Amplificador D: Polyvox PM5000

MÉDIAS DOS RESULTADOS (MELHOR 4 e PIOR 1)

Com base nas pontuações acima, excluindo-se a música 5, que deve ser usada como base para avaliação individual do efeito de “bias” na audição, chegamos às seguintes médias, ponderando-se quem pontuou de 1 a 5 para 1 a 4.

Música1 Música 2 Música 3 Música 4
Classe A 3,7 3,6 3,8 3,5
PA800 3,2 3,2 2,9 3,1
DBS360 2,8 3,0 2,8 2,9
PM5000 2,4 2,5 2,4 2,5

CONCLUSÕES

O teste em si não pode ser classificado como perfeito para avaliação dos amplificadores. Há uma interação com o equipamento/ambiente dos ouvintes que varia de um para outro, mas serve de base para uma análise relativa entre eles. O mais importante do experimento é essa análise relativa

O nível baixo das gravações foi percebido pelos ouvintes, bem com a inversão dos canais. Ambos foram propositais.

O sinal de teste de 19,5kHz aparentemente não foi percebido e, com isso, podemos ter demonstrado a redução da capacidade auditiva com a idade, pois todos no grupo têm mais que 40 anos de vida, pelo que sei.

Apenas o Ouvinte III pontuou da mesma maneira a gravação 5, o que sugere um efeito de “bias”, subjetivo, dos demais. Isso é, como vocês podem perceber, bastante comum e muitas vezes permeia nossas discussões na lista.

Como os ganhos dos amplificadores eram mais ou menos idênticos, pude manter o nível de saída do Tidal aproximadamente igual para todos os amplificadores, o que traz mais segurança da equanimidade dos testes.

Para os que perceberam diferenças significativas, conforme a tabela de médias de pontuação, o meu amplificador classe A e o Cygnus PA800 aparentam ter tido desempenho melhor que o do de PA (Wattsom DBS360) PA e o PM5000, de uma forma geral.

De uma forma geral, creio que o mais importante foi mostrar que muitas vezes nossos ouvidos nos pregam peças e que, sob condições normais, seria também difícil perceber diferenças entre amplificadores, de PA ou residenciais, em uma audição despretensiosa, como vários ouvintes declararam.

Forte abraço!

speaker

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